sexta-feira, 28 de maio de 2010

Painel 28/05 - Especial Europa

ESPECIAL/EIU: COMO A SOLVÊNCIA FISCAL PODERÁ SER RESTAURADA NA UE?

Da Economist Intelligence Unit

Medidas emergenciais para aliviar as pressões financeiras na zona do euro fracassaram em tranquilizar os mercados, em parte devido à incerteza sobre como as novas medidas (como um pacote de ajuda no valor de € 750 bilhões) irá funcionar na prática, mas também porque tais medidas enfrentaram majoritariamente as pressões de liquidez e deixaram as questões subjacentes de solvência fiscal sem solução. A fim de recuperar a confiança do mercado, os países membros da zona do euro em questão (especialmente Grécia, Portugal, Irlanda, Espanha e Itália) terão de, afinal, restaurar sua solvência fiscal. Este artigo esboça os diferentes meios pelos quais isso poderá ser alcançado, e avalia brevemente os resultados mais prováveis para os países que correm mais risco.As opções de solvência fiscalCrescimento econômico: Esta é a forma menos dolorosa, mas infelizmente não é um instrumento de política. O crescimento é determinado por uma série de fatores (demográficos, de produtividade, condições financeiras, demanda externa) sobre os quais os governos têm pouca influência no curto prazo. Há escopo, sem dúvida, para os países periféricos da zona do euro impulsionarem o crescimento econômico e melhorarem a competitividade por meio de reformas do lado da oferta, incluindo a desregulamentação dos mercados de trabalho, produção e serviços. Mas tais reformas enfrentarão resistências de interesses estabelecidos. Mesmo se conseguirem vencê-los, as compensações levarão tempo para se materializar. Consolidação fiscal: Isso exige uma combinação de cortes de gastos e aumento de impostos a fim de gerar uma melhora suficiente no resultado fiscal primário (excluindo custos com juros) para estabilizar e então trazer a relação dívida/pública para baixo. A principal desvantagem da consolidação fiscal é que poderá prolongar a recessão, paralisar uma recuperação incipiente e enraizar a deflação, e assim mais exacerbar do que aliviar os problemas de solvência para os setores público e privado da mesma forma. Os programas de ajuste do FMI nas economias do sudeste da Ásia em 1997-98 foram criticados por essas razões. Quaisquer que sejam os prós e contras, entretanto, os governos periféricos da zona do euro não podem mais se dar ao luxo de postergar o ajuste fiscal. Os mercados financeiros estão demandando ação imediata para cortar os gastos e elevar as receitas. Ainda assim, a consolidação fiscal nem sempre precisa ser negativa para o crescimento, mesmo no curto prazo. Esse pode ser o caso na Grécia, onde as ineficiências e a corrupção são generalizadas no setor público.Transferências fiscais: Um sistema formal de transferências fiscais dos países mais fortes para as economias mais fracas da zona do euro aliviaria os temores de solvência mais à frente. Entretanto, não há nenhum interesse público por tais transferências entre as classes política e pública na Alemanha, e seria necessária a aprovação da Alemanha para tal mudança, dado seu status de maior economia na zona do euro e Estado que teria de fazer a maior contribuição para tais transferências. A resistência às transferências poderia se enfraquecer se a integração fiscal e política vier a ser percebida como necessária para a sobrevivência de longo prazo da zona do euro. Poderá ser um preço que a Alemanha - cujos exportadores se beneficiaram da criação do bloco - eventualmente julgaria ser necessário pagar, mas atualmente a prescrição da Alemanha para apoiar a zona do euro apóia-se apenas no fortalecimento da disciplina fiscal de cada membro individualmente. Essa solução não reconhece os desequilíbrios dentro da zona do euro como um problema. Captação conjunta de recursos: Na ausência de transferências fiscais, outra opção seria os Estados membros emitirem bônus conjuntamente. Os Estados mais fracos se beneficiariam do efeito poderoso que emanaria dos mais fortes, e dessa forma desfrutariam de acesso ao financiamento em melhores condições que reflitam parcialmente a solvência dos Estados mais fortes. A emissão conjunta de bônus não integra as recentes medidas da União Europeia para combater a crise, presumivelmente devido à resistência dos membros mais fortes da zona do euro. Default: Em casos de default, os devedores restauram sua solvência por meio da imposição de perdas aos seus credores. Um default de um país desenvolvido era considerado impensável antes da crise financeira de 2008-09, mas agora os mercados estão atribuindo uma elevada probabilidade de a Grécia reestruturar sua dívida dentro dos próximos anos. Mesmo com um ajuste fiscal drástico, a relação dívida pública/PIB da Grécia poderá chegar a 150% em 2012. O cenário central da Economist Intelligence Unit é que uma reestruturação acontecerá em 2012, uma vez que os € 110 bilhões do pacote de ajuda conjunta da UE/FMI para o país chegar ao fim. Poderá acontecer antes disso se os custos sociais e políticos da austeridade se provarem insustentáveis. Dada a escala do ajuste fiscal que a Grécia precisa fazer para restaurar a solvência, pode-se argumentar que seria melhor para as autoridades europeias aceitarem logo que a dívida é insustentável e encorajarem a Grécia a negociar um acordo de reestruturação de dívida com seus credores. Parte dos recursos da UE e FMI poderia, então, ser empregada para recapitalizar os bancos gregos (cujo capital desapareceria no caso de um default soberano da Grécia). Mas as autoridades europeias descartaram tal caminho, em parte por temerem que um default grego gerasse contágio e afetasse ainda mais a confiança dos investidores na solvência de outros membros fracos da zona do euro.Se a Grécia reestruturar sua dívida, esperaríamos que um acordo resultasse numa perda de 25% a 30% para os credores. Isso ainda deixaria a Grécia com uma carga de endividamento do setor público acima de 100% do PIB, embora uma reestruturação provavelmente incluísse elementos para aliviar os custos do serviço da dívida no curto prazo, incluindo o alongamento dos vencimentos. Reestruturações de dívida inevitavelmente geram prejuízos, mas seria crucial para a Grécia mostrar boa fé nas negociações com os credores. De outra forma, o país poderia ser excluído dos mercados globais de capitais por um longo período, como aconteceu com a Argentina. AS IMPLICAÇÕES DE UMA SAÍDA DA ZONA DO EURO A saída da zona do euro não é uma eventualidade considerada nos tratados da União Europeia. Tem sido dito que a Alemanha estaria a favor de introduzir a expulsão como uma sanção aos países que fracassarem em manter sua disciplina fiscal. Mas a menos que essa medida seja adotada, sair da zona do euro e adotar uma moeda nacional continuaria sendo uma decisão a ser tomada pelos governos nacionais individualmente. Uma nova moeda seria introduzida a uma taxa desvalorizada como uma forma de restaurar a competitividade, reanimar o crescimento e possivelmente viabilizar uma saída da deflação. Além do curto prazo, países que optarem por esse caminho provavelmente retrocederiam aos ciclos de inflação e desvalorização cambial que caracterizaram suas economias antes da adoção do euro.Superficialmente, sair da zona do euro pode ter mais apelo do que as "desvalorizações internas" feitas pelas economias dos Bálticos com regimes de currency board, que envolveram grandes cortes nos salários nominais e benefícios. Mas a decisão de um país de deixar a zona do euro faria isso a partir de uma posição de fraqueza, sem os recursos para administrar uma desvalorização controlada. A nova moeda muito provavelmente despencaria, tornando os passivos denominados em euro acumulados ao longo da última década impossíveis de serem pagos. Isso geraria uma insolvência generalizada tanto no setor financeiro quanto no setor privado como um todo. Os credores enfrentariam taxas reduzidas de recuperação nos seus empréstimos denominados em euro, e o país em questão enfrentaria um longo período de exclusão do mercado global de capitais. Dados esses riscos, aderir ao status de ajuste dentro da zona do euro deveria ser a opção menos pior para um governo racional. Mas o risco de um país deixar a zona do euro não pode ser descartado. Num contexto que provavelmente seria caracterizado por instabilidade social e política, deixar a zona do euro poderia ser uma medida desesperada adotada por um governo sem forças para manter a ordem social, independente dos custos futuros de tal decisão. PREMISSAS PARA OS PAÍSES PERIFÉRICOS A Economist Intelligence Unit prevê que nenhum dos países da União Europeia cuja solvência está mais em dúvida irá abandonar o euro. Estamos prevendo uma reestruturação de dívida apenas na Grécia neste momento. Nós assumimos que um misto de consolidação fiscal e um retorno ao crescimento (ajudado por um euro possivelmente mais fraco) irá permitir que os outros países estabilizem sua dívida pública e evitem um default. Entretanto, o nível de endividamento público nesses países continuará desconfortavelmente elevado e eles enfrentarão um período prolongado de ajuste, um severo contraste em relação aos anos do 'boom' que desfrutaram - com exceção de Portugal - na primeira década de existência do euro. Grécia: Mesmo sob cenários mais benignos, a dinâmica da dívida pública parece insustentável. A Grécia um caso clássico de má gestão fiscal. O setor privado grego não está pesadamente endividado. Como a Grécia é uma economia pequena, poderá ser possível conter o risco de contágio de uma reestruturação de dívida se outros países fracos da zona do euro fizerem progressos na estabilização de suas finanças públicas a tempo.Portugal: A gestão fiscal é muito melhor e mais transparente do que na Grécia, e o governo implementou reformas que reduzirão o déficit no médio prazo. O governo também cortou gastos recentemente para reduzir o déficit neste ano, mas o déficit fiscal e o déficit primário são grandes. Estamos prevendo que a relação dívida pública/dívida vai chegar a 85% até o fim de 2010. O histórico de crescimento econômico de Portugal ao longo da última década é pobre. Tirando uma indústria de energia renovável, há poucas fontes de dinamismo econômico que possam permitir que Portugal cresça para sair da dívida. O setor privado também tem uma grande carga de endividamento como legado do 'boom' de crédito que ocorreu na reta final da adesão ao euro. A reduzida taxa de poupança de Portugal deixa o país dependente do financiamento externo. Embora não seja nossa projeção central, atribuímos uma elevada probabilidade de Portugal precisar do seu próprio pacote de resgate da UE/FMI.Espanha e Irlanda: Os dois países permitiram que seus setores financeiros se expandissem rapidamente durante os prolongados 'booms' de construção e propriedades. Os superávits fiscais se transformaram em grandes déficits desde que essas bolhas estouraram. A Irlanda foi rápida em adotar drásticas medidas de ajuste fiscal, incluindo grandes cortes nos salários nominais e aumento de impostos, além de ter nacionalizado um banco e criado um 'banco podre' para absorver os empréstimos de má qualidade. A mão-de-obra bem treinada e o clima favorável para negócios fornecem alguma base para ter otimismo em relação às perspectivas de crescimento futuro, mas aumentos adicionais nos empréstimos duvidosos e a escala acentuada do setor financeiro da Irlanda em relação à sua economia são as principais preocupações. A taxa de desemprego na Espanha é a maior da Europa, e não há muitas fontes de crescimento e empregos futuros. Como na Irlanda, o tamanho do setor financeiro da Espanha é um problema. A necessidade de ajuste fiscal está clara, e o governo está tomando medidas atrasadas para reduzir o déficit, incluindo um corte de 5% nos salários dos trabalhadores do setor público. Mas é provável que a austeridade fiscal leve a um aumento na inadimplência dos financiamentos, prejudicando a solvência do setor financeiro. Os grandes bancos da Espanha provaram-se resistentes até agora,mas eles poderão estar vulneráveis nesta nova fase da crise. Os bancos regionais de poupança (cajas) estão em péssimas condições e exigem apoio do governo e reestruturação.Itália: A Itália tem a segunda maior carga de dívida pública após a Grécia. Entretanto, o governo restringiu o Orçamento em 2009 para 5,3% do PIB, uma conquista diante da contração de 5% do PIB. No nível primário, as contas fiscais estão perto do equilíbrio, e o setor privado não está pesadamente endividado, limitando a dependência da Itália da poupança externa. Os spreads dos bônus do governo da Itália não se ampliaram muito desde que a crise se agravou, e seus leilões de dívida estão atualmente bem cobertos. Os exportadores da Itália se beneficiarão do euro mais fraco, mas é provável que o crescimento seja modesto, e o nível da dívida pública deixará a Itália vulnerável no caso de outra recessão. (TRADUZIDO POR ANDRÉIA LAGO) Fonte: Economist Intelligence Unit

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